domingo, 19 de julho de 2009

REVISTA Dicta Traz ensaios Polemicos



Jovens criam controvérsia com revista
"Dicta&Contradicta" chega ao terceiro número, repele rótulo de direitista e ironiza "Serrote" por "certo grau de imitação"

O jornalista Flávio Pinheiro, do Instituto Moreira Salles, que publica a "Serrote", diz que "nessa área ninguém vai inventar a roda"

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
DA REPORTAGEM LOCAL

Tudo começou com um grupo de estudos de filosofia, no início de 2004, formado por amigos que não eram exatamente do ramo -basta dizer que Guilherme Malzoni Rabello, 25, um dos idealizadores dos encontros, estudava engenharia naval. Aos poucos, o núcleo se expandiu e surgiu a ideia da criação de um instituto cultural, que daria seus primeiros passos apoiado numa revista semestral de ensaios.
No mês passado, a "Dicta&Contradicta" chegou a seu terceiro número reunindo um elenco de jovens desconhecidos, autores estrangeiros pouco divulgados no país, medalhões da direita, como Olavo de Carvalho, e expoentes da recente safra conservadora, caso de João Pereira Coutinho, colunista da Ilustrada.
Por ora, o Instituto de Formação e Educação, que Guilherme preside, não é mais do que um telefone com prefixo paulistano e caixa postal -mas se depender da ambição dos rapazes será muito mais.
"Estamos apenas começando um projeto que pretendemos consolidar no futuro, um projeto de vida", diz Guilherme, já satisfeito com os primeiros resultados da publicação, que tem um site no endereço www.dicta.com.br.
Para uma revista que chegou às livrarias como uma espécie de objeto não identificado, vender 1.000 exemplares seria ótimo, mas 500, segundo Guilherme, ainda daria para começar. Surpreendentemente, o primeiro número, lançado em junho do ano passado, já chegou à casa dos 2.000.
O êxito parece ter estufado a autoestima do grupo. Na edição mais recente, a "Dicta" endereçou uma irônica mensagem de boas vindas à revista "Serrote", do Instituto Moreira Salles, chamando-a de "irmã mais nova": "É uma alegria ver que atingimos o nosso ideal de estimular o debate de ideias no país... ainda que seja à custa de um certo grau de imitação".
Para o jornalista Flávio Pinheiro, superintendente executivo do IMS e um dos responsáveis pela "Serrote", não é possível "nem remotamente" falar em imitação.
"Alimento a ideia de uma revista de ensaios como a "Serrote" há anos. Nessa área ninguém vai inventar a roda. Revistas de ensaio já existiram aqui há décadas e há inúmeros exemplos em diversos países."
Pinheiro vê na "Dicta" uma representante do "pensamento conservador, liberal, que é preciso existir". Mas não contrapõe a "Serrote" -que já atingiu cerca de 4.000 exemplares desde o início de abril- a esta linha. "A Serrote quer ser inteligente, quer contribuir para a divulgação do ensaio fora da tradição acadêmica, como um gênero que mistura erudição, clareza e audácia de opinião."
Para Guilherme e o coeditor editor Martim Vazques da Cunha, as duas revistas são concorrentes e isso é estimulante. "Sabemos que a "Serrote" pode trazer coisas interessantes, o que aumenta nossa exigência."
Pinheiro preferiu ao comentar a revista evitar a classificação de "direita" -termo que Guilherme repele: "O que significa isso exatamente? Eu, com toda sinceridade, não sei. O nosso objetivo com a "Dicta" é justamente questionar esses critérios".
Mesmo a qualificação de "conservadora" não é bem vista, embora a preferência por temas e angulações dessa orientação seja evidente na revista, que publica, por exemplo, ensaio atacando o modernismo e demonstra simpatia por autores como Edmund Burke e Ortega e Gasset.
"A cultura deveria ser o que julga as ideologias. Tratá-la a partir de conceitos como "conservadorismo" ou "progressismo" leva à consequência de se criar um esquema reducionista, ou seja, falso", argumenta Guilherme.
A publicação, segundo ele tem "interesses e valores comuns". Cita entre eles "a convicção de que qualquer resultado intelectual de peso só se consegue atingir pelo estudo e pelo trabalho sério e a primazia da pessoa diante do Estado ou grupos ideológicos".
Mas esses valores, diz ele, "não são uma causa, e sim uma diretriz."

Um comentário:

  1. O elogio do ensaio


    “Dicta & Contradicta” e “serrote”, duas revistas culturais em formato de livro, exploram novo nicho do mercado editorial brasileiro.
    Por João Villaverde, de São Paulo



    Quando Guilherme, Martim, Rodrigo, Renato e Henrique decidiram formar um grupo de estudos para pesquisar a filosofia de Platão, com reuniões aos sábados na casa de um deles, os planos não iam muito além da conclusão de seus cursos de graduação e de mestrado. A preocupação imediata era arranjar um emprego, cada um no seu setor, e os estudos da filosofia clássica não passavam de uma curiosidade motivada pelo interesse em novos conhecimentos, distintos daqueles essenciais às carreiras de cada um.

    Três anos depois, quando os sábados filosóficos já reuniam o triplo de participantes, o mais recente integrante do grupo, Rodolfo, sugeriu que eles formassem um instituto, para formalizar as pesquisas e não perder o ímpeto dos estudos. A ideia não agradou. Guilherme, que se formava em engenharia naval, julgava que era preciso “ao menos dez anos” para que obtivessem massa crítica suficiente para “bancar um instituto de estudos acadêmicos”. Como saída, concordaram com a ideia de começar com a publicação de uma revista cultural.

    Nascia ali o Instituto de Formação e Educação (IFE), projeto que, em junho de 2008, desembocaria na “Dicta & Contradicta”, revista de ensaios sobre a cultura clássica ocidental. O IFE foi criado pelo núcleo dos rapazes que tocava o grupo de estudos - Guilherme Malzoni Rabello, Henrique Elfes, Joel Pinheiro da Fonseca, Júlio Lemos, Luiz Felipe Estanislau do Amaral, Marcelo Consentino, Marcello Nébias Pilar, Martim Vasques da Cunha, Renato José de Moraes, Rodolfo Britto e Rodrigo Duarte Garcia. São jovens de áreas profissionais distintas - direito, engenharia naval, economia e jornalismo - e com idades que variam entre 23 e 33 anos. A exceção é o editor Henrique Elfes, com 50 anos.

    ”Foram oito meses discutindo as bases que forjariam nosso instituto e, claro, nossa revista”, diz Cunha, jornalista responsável e coeditor da revista ao lado de Fonseca e Garcia. Os planos eram diretos: a “Dicta & Contradicta” foi criada para pensar e disseminar conhecimento nos campos das humanidades, artes e filosofia em longo prazo, algo que, para os criadores do IFE, não ocorre no Brasil. “Não se pensa cultura no longo prazo e não se pensa em termos econômicos e administrativos. O debate cultural no Brasil é muito preso à agenda, não foge disso”, diz Rabello, presidente do IFE.

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