quinta-feira, 4 de março de 2010

Um Panteao de Grandes escritores

Bate-papos são comuns no exterior


Prova disso é a chegada ao País da série promovida pela Believer entre escritores



Ubiratan Brasil

O encontro marcado entre Ana Maria Machado e Moacyr Scliar com a finalidade de produzir um livro ainda é um fato raro no Brasil, ao contrário de outros países - revistas literárias de graduações diversas promovem estimulantes diálogos entre escritores de almas gêmeas. A Believer, por exemplo, é uma das publicações mais importantes dos Estados Unidos. Com apenas dez exemplares lançados por ano, ela se define como "uma revista sobre autores e livros de que gostamos". E é justamente uma seleção das entrevistas promovidas pela Believer que confere o charme de Conversas entre Escritores (tradução de Irinêo Netto, Miguel Nicolau Abib Neto e Ernesto Klüpel, 315 páginas, R$ 59), mais recente publicação da Arte & Letra, interessante editora de Curitiba.



Trata-se da reunião de 21 bate-papos entre autores, em sua maioria de língua inglesa. Nomes do naipe como John Banville, Ian McEwan, Paul Auster, Haruki Murakami, Orhan Pamuk, Zadie Smith e Dave Eggers que, além de escrever roteiros para filmes de sucesso (Onde Vivem os Monstros), também é o fundador da editora McSweeny"s, que lança a Believer. E ele comanda ainda uma das conversas mais interessantes, em que a escritora e jornalista Joan Didion (autora do belo O Ano do Pensamento Mágico, lançado aqui pela Nova Fronteira) se despe de qualquer esnobismo que a profissão poderia lhe permitir (confira trecho no alto desta página).



Boa parte das entrevistas aconteceu no início desta década, o que transforma certos assuntos da época em pauta recorrente. Como o atentado terrorista de 11 de setembro de 2001, que derrubou as torres gêmeas em Nova York. O tema norteia, por exemplo, o início da conversa (aliás, uma das melhores do livro) entre Zadie Smith e Ian McEwan que, naquele momento (2004), recém-lançara Sábado (Companhia das Letras), romance que aborda o 11 de Setembro de forma oblíqua. "Fica claro que o fato ocorrido naquele dia já era um incidente típico de um livro seu", pondera Zadie, que se revela profunda conhecedora da obra do inglês. "Porque, de qualquer forma, a explosão do irracional dentro do racional era o seu "modus operandi". Porque sua ficção já era sobre a ideia de uma intervenção maligna."



McEwan concorda, afirmando que o trágico incidente representou um momento glorioso para o jornalismo - afinal, em todo o mundo, jornais mudaram radicalmente sua pauta e produziram diversos cadernos em pouco tempo. Daí sua intenção de, ao escrever Sábado, não produzir ficção. "Mesmo enquanto escrevia, pensava que, para tornar a situação mais humana, seria preciso mais que jornalismo, seria necessário algo mais íntimo que isso. Lembrar que várias daquelas pessoas declaram seus amores pelo celular..."



Dissecar o "modus operandi", aliás, é um grande motivador das entrevistas. Os escritores não escondem sua curiosidade em descobrir as motivações que levaram o colega a enveredar por tal caminho. Julie Orringer, por exemplo, especula com Tobias Wolff se sua passagem pelo colégio interno foi decisiva para, no futuro, aprender a manipular a verdade em proveito próprio. "Quando saí do internato, já sabia que queria ser escritor", responde ele. "Isso pode soar incomum ou, no mínimo, oportunista, mas, quando cheguei lá, sabia que um dia escreveria sobre aquele lugar."



Angústia provocada pelo ato da escrita, aliás, já era um tema tratado por Clarice Lispector que, no fim dos anos 1960, entrevistou personalidades para a revista Manchete para complementar o orçamento doméstico. Entre seus preferidos estavam, claro, outros autores. Era nesses momentos, na verdade, que Clarice revelava suas inquietações com o ofício, buscando compartilhar as dúvidas. "Fernando (Sabino), por que é que você escreve? Eu não sei porque escrevo, de modo que o que você disser talvez sirva para mim", diz ela, na conversa reunida em Entrevistas (Rocco). Incerteza que, além de universal, parece eterna.



Conversa entre famosos



"Como consequência de meu incêndio, passei quase três meses no hospital. E recebia visitas até de estranhos. Não acredito que não se tenha amigos. É que são raros"

CLARICE LISPECTOR



"Uma vez, fiquei gravemente doente. Recebi em três meses de agonia três visitas, uma por mês. Aí, eu sofri na carne e na alma esta verdade intolerável: o amigo não existe"

NELSON RODRIGUES



"Quando você vê um escritor se mover na direção de sua fase mais criativa, sempre imagino que ele conseguiu encontrar o seu tempo ou que seu tempo conseguiu

encontrá-lo"

ZADIE SMITH



"Sempre achei que a crueldade é uma falha da imaginação. E sei que incluo

nisso a possibilidade de que alguém tenha extrema empatia pela sua vítima"

IAN McEwan



"Porque a prosa de Didion é tão extraordinariamente precisa, alguns esperam que, ao vivo, ela seja uma contadora de causos. Na realidade, ela é uma pessoa"

DAVE EGGERS



"Continuo pensando que somos capazes de aprender. Que vamos perceber o valor daquilo que temos e assumir o compromisso de investir na universidade"

JOAN DIDION

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